O rasurado azul de Paris - poemas para Arthur Rimbaud
Flor escandalosa
Meu pai sonhava o deserto
E viveu ao lado do amor
Rimbaud sonhava as areias
Também reinventar o amor
Rimbaud viveu no deserto
Meu pai morreu de amor
Meu pai surfava o mar de estrelas
Com um teodolito da cor da destemperança
- verde oliva que tende ao amarelo –
Quando eu dormia ele soprava
Sementes de poesia
Por cima das minhas cobertas
Rimbaud passava noites inteiras
Regando com um regador de nuvens
Minha alma de fogo e a semente
Nasceu esta flor escandalosa
Misto de estrela e rosa
Da cor dos olhos do amor
E do deserto sonhado
Por meu pai e Rimbaud
Meu pai viveu em poesia
Nunca escreveu um verso
Rimbaud desistiu bem cedo
Meu pai sabia; sabia Rimbaud
O vento que atravessa a cortina
Traz a voz de ambos, mixada:
Ilumine o verbo!
Incendeie a alma!
Faça de corações desertos
Cactos em flor
Sangue em ebulição
*
quando ele corria
pelos telhados de ardósia
as pombas arrulhavam
em ventania
seu casaco - vela sacudida
estremecia
a maré da monotonia
Dans l’air
Tínhamos a mesma idade
Quando vimos o mar
Este mistério de impaciência
Tínhamos a mesma impaciência
– Rimbaud e eu –
Por isto
Pisamos telhados
Ao invés do chão
Por isto
Machucamos nossos amores
Com nossas próprias mãos
Por isto
As velas acabam na madrugada
Antes que o poema acabe
- Por isto, tão pouca a vida para tanta voracidade.
Mar/absinto
Nossos olhos de dezoito anos
acomodaram o mar
Sobrou a maré em torno
um sussurro de conchas
a nos acordar nas noites brancas
Nossos olhos de dezoito anos
beberem do mar/absinto
como ao vinho santo.
Nossos olhos embriagados.
Nossos olhos negros e azulados.
Uma sereia recolhendo a rede
os corações de dois poetas ali
enredados
Nossos olhos de dezoito anos.
Nossas almas milenares.
Nossos amores fracos à soleira da incerteza.
Tanta beleza em ti, Rimbaud!
Tanta ausência em mim!
E nas marquises
bêbados ainda caminham
buscando o sol
que você guardou prá mim
Bárbara Lia
5 comentários:
Sem palavras para comentar estes belíssimos poemas...deixo registrada a minha emoção.
beijos
perfeitamente lindo tudo isso!!!!
bjosss
ei Cássio, belos poemas da Bárbara Lia.
deixa eu aroveitar esta visita pra pedir mil desculpas pelas não-visitas ou pela minha ausência recorrente, mas minha vida é um caos. o que não é nenhuma desculpa para a minha indelicadeza, claro.
de qualquer maneira, deixo minhas desculpas, meu carinho e um beijão.
Viver em poesia é uma sabedoria.
Muito bonito os poemas.
abraços
agradecida meu querido pelo lindo poema que deixou por lá, pela música do Lenine...por tudo, pelo seu carinho enfim.
Te gosto um tantão!
beijos, que seja ótimo o seu domingo!
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